segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Situações...

Já não tenho freio nas minhas próprias palavras. Se dou um conselho, mesmo que boa a minha intenção, nunca sei se mais valia ter ficado calado. Se, pelo contrário, permaneço calado, esgoto-me sempre em falta comigo mesmo: poderia ter feito qualquer coisa...
Tal é o compromisso que tenho com o mundo; quer me cale ou não, quer ande ou fique parado: escolho-me; escolhendo-me a mim e ao mundo.
Subiamos as frias ruas da Covilhã. Ao fim de três meses de pausa académica, acompanhava agora Álvaro até à porta de sua casa. Quando, e já no meio da caminhada, espicaçada a minha curiosidade pelo seu aparente distanciamento, me (e)levou esta a consciência à interrogação: Que se passa hoje contigo, Álvaro?
Maldição das maldições! O juiz tinha dado ordem para que princípiasse a marcha!
Falara-me Álvaro, de um pai ausente, que só à coisa de dois meses, se revelara ao pequenos mas profundos olhos verdes do desajeitado filho, e que amanhã - logo amanhã! - faria 54 anos... A mãe de Álvaro, naturalmente, não tinha ficado muito contente com súbita aparição, - após 21 anos do nascimento de Álvaro. Talvez tivesse ela - medo! - que este lhe "roubasse" o seu único filho. Talvez fosse isso...
Depois de aceso um cigarro, Álvaro relatava-me a forma como a sua mãe ultimamente o importunava insistentemente com as "causas" que levaram à separação do casal. Juventude; falta de maturidade; desconhecimento; negação de compromisso... Enfim, todo um rol de palavras sempre insuficientes para determinar um homem livre.
O problema é, hoje fazia anos o seu pai, e Álvaro não conseguia encontrar razões bastantes para aceitar ou, pelo contrário, renunciar ao seu convite... passar o dia deambulando pelos altos da serra... na tentativa de nos conhecermos melhor... Álvaro, no fundo, sabia que sua mãe, legitimamente, não iria ficar contente se aceitasse tal proposta, e afinal, este seu "pai" não passava ainda de um homem estranho, - um perfeito estrangeiro...
Parámos por fim, em frente à porta de sua casa, mas ele há muito me abandonara no caminho... Na verdade! A partir do momento da sua confissão, eu nunca estive com ele!
O que devo fazer? Importunou-me ainda por uma última vez!
O que devo fazer? Eu, como de costume, nada disse... Ele também, nada me pediu... Desejamos, por fim, um boa noite mútuo; ele desapareceu pelas recém-caiadas paredes de sua casa, e eu prossegui a minha caminhada...
No fundo, eu tinha consciência, - Ele tinha consciência! -, poderiamos ter perdido a noite inteira em frente à porta de sua casa, colocando pesos sobre pesos na balança que ela decerto não tenderia favoralmente para lado algum... Eu tinha consciência, - ele tinha consciência! -, e já no rebordo da minha cama, imaginava-o acendendo um último cigarro na varanda, repetindo a mesma pergunta aos céus e além-céus, - O que devo fazer? -, sem que dos céus e além-céus sobreviesse resposta alguma, não sendo, - o eco da sua própria pergunta...

David Santos aluno de filosofia na UBI

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