quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Testamento Político, D. Luiz da Cunha


O autor desta obra, manuscrita no século XVIII, sugere a D. José, na época ainda príncipe, que tome para futuro regente do reino Sebastião José de Carvalho e Melo (futuro Marquês de Pombal), projetando as matrizes pelas quais se iria nortear a administração pombalina. Debruçando-nos de forma breve, agora nos dados biográficos do autor, D. Luiz da Cunha nasceu em Lisboa a 25 de Janeiro de 1662. Formando-se em direito canónico em 1686; em 1696 inicia a sua carreira diplomática em Londres como embaixador em Portugal; falecendo em Paris a 9 de Dezembro de 1740.
Nesta obra, o autor adverte para a importância do bom governo da nação, da importância da autoridade real ser reforçada perante a autoridade do ministro para evitar a diminuição de crédito e prejuízo do monarca perante os estrangeiros, recorrendo ao exemplo o duque de Malborough que se levantou com o poder que era devido a rainha Ana de Inglaterra. Além disso, existe ainda a analogia do rei com o pai de família; qual pai que se mostra regrado e em que cada um dos seus domésticos exercem as funções que lhes competem, sendo exemplo disso os secretariados pelos quais se divide o poder; em que além destes deveres, o rei deve aparecer em público afim de corresponder ao amor do povo, acompanhado das suas tropas com o intuito de mostrar a sua autoridade, de procurar manter a paz para não perturbar a economia e de vigiar a sua riqueza e de controlar os seus gastos, estando estes pontos ligados a dois eixos que também se encontram interligados entre si: a justiça e o bom governo do país. Continuando ainda a falar de medidas, o rei deve visitar as suas terras afim de as controlar, por essa razão deve mandar construir vias de comunicação, sendo a sua utilidade alastrada à produção e, inevitavelmente, ao comercio. A respeito de economia, o autor sugere que a cobrança de impostos não só deve ser feita às heranças como também à igreja, pois todos devem contribuir para o Estado sem exceção. Quanto aos incentivos, recomenda-se a retirada das terras a quem não as cultiva para as entregar nas mãos de quem se comprometa a cultiva-las; além da promoção e mecenato do produto nacional exercida pelo rei, tendo como exemplo a área do vestuário, em que o rei se vestia apenas com aquilo que fosse produto português mostrando o seu desagrado por aqueles que usassem vestuário de origem além-fronteiras, para que dessa forma todos se sentissem compelidos a usar aquilo que era produzido pelo nosso país, além de ir contratar os melhores artesãos estrangeiros para a manufatura de tecidos, como o fizeram o Czar da Moscóvia e el-rei Guilherme III da Inglaterra.
Passando agora para questões de ordem social. Talvez, uma das grandes propostas que este autor fez foi: por fim a distinção entre cristão-velho e cristão-novo dando a possibilidade de livre exercício da prática religiosa, sendo que isto não só seria bom para a economia do país como para o aumento demográfico, porque assim existem mais pessoas para produzir. Outro ponto é a obrigação dos corregedores e juízes a entregar todos os meses ao presidente do paço ou ao regedor das justiças uma lista das pessoas que vivem na sua jurisdição e das suas ocupações para não consentirem na entrada de marginais, como acontece na Holanda. Seguindo este rego, exige-se uma maior celeridade da justiça, pois certos casos que são demorosos tanto podem ser prejudiciais para vítima como para o culpado, não só por razões de perda de tempo como de custos do processo; a acrescentar, temos ainda um maior controlo dos rendimentos dos agentes da justiça, sendo que em caso de corrupção, os mesmos devem ser passíveis de sofrer coima e prisão efetiva, sendo a severidade da punição equivalente à dimensão do crime.
Outros assuntos com que nos deparamos na leitura da obra, são as relações políticas e comerciais de Portugal com outros países.  
Podemos concluir que foi graças a estrangeirados, como D. Luiz da Cunha, que se introduziram em Portugal, obscurecido pela ignorância e fideísmo vivido até ao Marquês de Pombal, novas ideias e formas de pensar, como grande exemplo disso é o fim da distinção entre cristãos-velhos e cristãos-novos, abrindo portas para a liberdade da prática religiosa e, com isso, a laicização do Estado. Mais, com a lista das ocupações realizada pelos corregedores e juízes e que era entregue mensalmente ao presidente do paço e ao regedor das justiças, abre-se a possibilidade para a criação dos censos. Porém ainda há muito a fazer em relação à justiça e à impunidade daqueles que dela conseguem escapar. Com atenção a isto e com a noção daquilo usualmente acontece na justiça portuguesa, o que é que o leitor acha que poderia ser feito para melhorar o funcionamento do sistema? Além disso, será que existe a necessidade do controlo das atividades de cada indivíduo para garantir a harmonia social, ou será que isso iria comprometer a (re)inserção do sujeito?
Despeço-me agora desejando ao nosso amigo cibernauta uma boa entrada de ano, pois prosperidade é como dizia Zeca Afonso naquela famosa canção: “Eles comem tudo…”, por outro lado também não podemos ser tão pessimistas, visto que ainda temos como alternativa emigrar.    

Fernando de Almeida.

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