quarta-feira, 5 de junho de 2013

Em democracia não deve haver governos impopulares


Agora anda em voga o argumento, que procura restaurar um mínimo de credibilidade a este governo pela hora da morte, que justifica a impopularidade deste pelo facto de tomar medidas anti-populistas, mas que, friso, tomam por absolutamente necessárias à resolução de dados problemas estruturais de Portugal, e que, enfim, apesar da sua impopularidade intencionam, no médio longo prazo, a restauração da saúde e bem-estar desta mesma população. Segundo este pensamento estamos portanto a passar por uma espécie de ritual colectivo de purificação (e tão doloroso que é!) que se legitima, paradoxalmente, pela promessa de um outro futuro desenvencilhado do peso da “queda”. Com um povo leviano e piegas que viveu a última década acima das suas possibilidades, uma elite política que só pensa em agradar aos seus eleitores esquecendo-se depois de que tem de pagar a factura da sua hybris, e por aí adiante.
Ora, a impopularidade deste governo não resulta do facto de tomar medidas anti-populistas que o corrente funcionamento da democracia representativa não permite em tempos “normais” – só em tempos de excepção como o que hoje vivemos com a governança paralela da troika. A impopularidade deste governo advém, ao pé da letra, da insistência dos seus representantes em cumprirem um programa que não é mobilizador em termos populares e que só é possível com uma agenda de alienamento dos cidadãos da participação na coisa pública. É este o nó górdio do famoso fosso entre governantes e governados.
A impopularidade deste governo não deriva do facto de ousar fazer cumprir medidas não populares mas que são, dentro da sua lógica, cruciais à restauração da credibilidade socioeconómica do país. Este governo é impopular, pelo contrário, porque falha a percepção popular da justiça social das suas medidas, e, para além do mais, não se vislumbram os resultados que estas prometiam - pelo contrário, há até uma regressão substancial em relação ao estado de coisas que prometiam remediar.
Em democracia não deve haver governos impopulares, as reformas a realizar devem ser trabalhadas num quadro em que se perceba a racionalidade democrática destas e o seu sentido de justiça – que, seguindo um liberalista político como John Rawls, é o valor por excelência da política. E só assim poderemos progredir em todos os âmbitos da realidade social sem deixarmos congelada a democracia em nome da saúde pública e do bem comum.


David Santos.

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