Não, hoje não se trata de mudar o mundo, trata-se de dar mais um "salto" na história - isto sem quaisquer hegelianismos, marxismos ou outros ismos. Não, não se trata de mudar o mundo como apregoava Marx no esforço de subverter, ou realizar pragmaticamente, o idealismo hegeliano. Trata-se tão só (e não julguemos que é coisa pouca!), de compreender que o mundo mudou e nós apenas parcialmente mudamos com ele. Que continuamos a usar os mesmos esquemas racionais/mentais, a mesma ética que há um século - e quem diz um século, di-lo por comodidade estilística!
Em parte - e, mais uma vez, sem heideggerianismos - hoje ainda não pensamos. No sentido em que continuamos reclusos de uma série de discursos e esquemas lógicos, retóricas também, que não são convergentes com o sentido que a actualidade tomou. Por isso, também em parte, que as mobilizações de hoje, da juventude (no sentido não estreito da idade!), focando-me no Ocidente, são fragmentadas e, no fundo, não têm a apresentar nada de novo - é uma juventude com mentalidade gasta (com certeza, contra mim mesmo falo!) - é-lhes ausente uma maneira de pensar autênticamente contemporânea, uma maneira de pensar eticamente (i. é, tendo em conta todo um novo padrão de comportamentos, de relação com os outros e com o mundo), uma ética e uma racionalidade não segmentada, não marginal, não retirada de velhos discursos e velhas tiradas.
Não é a questão de "descobrir a pólvora" é sim a de reconhecer o nosso falhanço (contrariamente a um certo discurso de Mia Couto, não creio que foi a anterior geração que fracassou, nós é que fracassamos quando julgamos que não há mais a fazer, que é o fim da história), a nossa incapacidade de dar um sentido, de construir uma nova racionalidade - com esta, uma nova ética, uma nova cultura - que compreenda - no sentido de abarcar, abranger - as várias mudanças que foram sendo introduzidas neste século, mudanças estas que atravessaram as gerações deste e do passado século sem que nós, verdadeiramente, as dominássemos ou sequer as acompanhasse-mos.
É certo que não sei, com a lucidez imprescindível, que racionalidade é esta que nós, juventude, precisamos de forjar, pensar e descobrir – só creio, e por enquanto, é muito mais essa intuição - essa "pedra no sapato" - que um conjunto estruturado de argumentos, que é imprescindível a esta nova racionalidade. Creio também que a raiz profunda de mobilizações como a geração à rasca, os indignados, os occupy… e, igualmente, o seu falhanço e não radicalidade, tem por fundamento um ressentimento novo - um ressentimento contra a nossa incapacidade de nos construirmos com as oportunidades (sublinho: oportunidades!) que os nossos tempos nos legam com as suas novas estruturas (que foram por nós causadas e estabilizadas) e "proeminências".
Repare-se, hoje, o conceito de rede, que a internet fez transparecer (disse "fez transparecer" porque, na verdade, a "ontologia" da rede, é mesmo o fundamento da existência colectiva – o "contrato social") está em conflito permanente e, aparentemente, sem fim à vista, com a protecção da propriedade privada (os direitos do autor como efeito da dinâmica jurídica do capital); o público e irrestrito (livre) está em permanente conflito com o privado e restrito - e isso também nos têm vindo a dizer o Guilherme e o Luís. Hoje há uma ética animal - ou alicerçada na consciência da nossa condição de terráqueos (como já nos havia ensinado Darwin há dois séculos atrás)- que está para além (ou aquém!) da estreiteza e miopia política ajuizada, catalisada, nas estreitas e míopes lutas de classe. Hoje propagandeia-se uma consciência ou ética ecológica da qual não percebemos verdadeiramente o significado, ou, essa mesma consciência convive, sem grandes perturbações, com o imperativo, quase que irracional, de crescimento económico - i. é, da dinâmica insaciável e irreprimível da oferta e da procura assente na produção e reprodução de bens materiais. Hoje, o conceito de trabalho, não tem uma relação capital com o homem; como o Ângelo diz abaixo: a precariedade banaliza-se, torna-se uma inevitabilidade, faz parte mesma da condição do homem contemporâneo. Hoje, modelos de auto-gestão da colectividade, estimulados, concentrados, ademais das vezes nos centros urbanos, através de projectos locais como o Orçamento Participativo, como o exemplo da cidade de Toronto, desenvolvem-se em paralelo, muitas das vezes em conflito, com os fluxos, aparentemente incontroláveis e consequências da categorizada globalização. Hoje, e como assistimos presentemente na vizinha Espanha, o conceito de Universidade tornou-se, não subitamente, estranho, não se sabe se esta deve ser a auto-estrada para o emprego garantido ou o lugar onde a vocação tem real oportunidade sem estar restringida, condicionada, pelas oportunidades (a oferta) que o mercado de trabalho, hipoteticamente, oferece. Hoje a consciência histórica – particularmente a europeia – torna-nos um pouco mais prudentes, mas, simultaneamente paralisa-nos, como dizia o outro: “nos puxa pelo casaco quando o que queremos é andar para a frente”.
Concluiu afirmando que a solução está na filosofia, não numa filosofia impropriamente institucionalizada, secretariada, mas numa filosofia que procura ir para além destas contradições, não no sentido nietzschiano de as ultrapassar, de se projectar para além delas, mas, mais moderadamente, de as compreender, de saber que as mudanças aqui assinaladas (que embatem frontalmente com velhas estruturas, com velhas mentalidades, com velhas formas de pensar a economia, a política, a sociedade, enfim, a existência colectiva...) são uma oportunidade para integrarmos uma nova ética, para edificarmos a tal nova racionalidade. O retorno ao nacionalismo, que parece querer vingar na grande Rússia (isto consoante nos noticiam), não é uma questão de regressão civilizacional, é uma questão de inadaptação, de incoerência, de ignorância, da falta de uma racionalidade que se consolida a partir das condições materias e pós-materiais vigentes. Precisamos, enfim, de uma filosofia que dê fundamento teórico à nossa acção, que lhe forneça um sentido. A geração à rasca precisa de mais filosofia...
David Santos.
Em parte - e, mais uma vez, sem heideggerianismos - hoje ainda não pensamos. No sentido em que continuamos reclusos de uma série de discursos e esquemas lógicos, retóricas também, que não são convergentes com o sentido que a actualidade tomou. Por isso, também em parte, que as mobilizações de hoje, da juventude (no sentido não estreito da idade!), focando-me no Ocidente, são fragmentadas e, no fundo, não têm a apresentar nada de novo - é uma juventude com mentalidade gasta (com certeza, contra mim mesmo falo!) - é-lhes ausente uma maneira de pensar autênticamente contemporânea, uma maneira de pensar eticamente (i. é, tendo em conta todo um novo padrão de comportamentos, de relação com os outros e com o mundo), uma ética e uma racionalidade não segmentada, não marginal, não retirada de velhos discursos e velhas tiradas.
Não é a questão de "descobrir a pólvora" é sim a de reconhecer o nosso falhanço (contrariamente a um certo discurso de Mia Couto, não creio que foi a anterior geração que fracassou, nós é que fracassamos quando julgamos que não há mais a fazer, que é o fim da história), a nossa incapacidade de dar um sentido, de construir uma nova racionalidade - com esta, uma nova ética, uma nova cultura - que compreenda - no sentido de abarcar, abranger - as várias mudanças que foram sendo introduzidas neste século, mudanças estas que atravessaram as gerações deste e do passado século sem que nós, verdadeiramente, as dominássemos ou sequer as acompanhasse-mos.
É certo que não sei, com a lucidez imprescindível, que racionalidade é esta que nós, juventude, precisamos de forjar, pensar e descobrir – só creio, e por enquanto, é muito mais essa intuição - essa "pedra no sapato" - que um conjunto estruturado de argumentos, que é imprescindível a esta nova racionalidade. Creio também que a raiz profunda de mobilizações como a geração à rasca, os indignados, os occupy… e, igualmente, o seu falhanço e não radicalidade, tem por fundamento um ressentimento novo - um ressentimento contra a nossa incapacidade de nos construirmos com as oportunidades (sublinho: oportunidades!) que os nossos tempos nos legam com as suas novas estruturas (que foram por nós causadas e estabilizadas) e "proeminências".
Repare-se, hoje, o conceito de rede, que a internet fez transparecer (disse "fez transparecer" porque, na verdade, a "ontologia" da rede, é mesmo o fundamento da existência colectiva – o "contrato social") está em conflito permanente e, aparentemente, sem fim à vista, com a protecção da propriedade privada (os direitos do autor como efeito da dinâmica jurídica do capital); o público e irrestrito (livre) está em permanente conflito com o privado e restrito - e isso também nos têm vindo a dizer o Guilherme e o Luís. Hoje há uma ética animal - ou alicerçada na consciência da nossa condição de terráqueos (como já nos havia ensinado Darwin há dois séculos atrás)- que está para além (ou aquém!) da estreiteza e miopia política ajuizada, catalisada, nas estreitas e míopes lutas de classe. Hoje propagandeia-se uma consciência ou ética ecológica da qual não percebemos verdadeiramente o significado, ou, essa mesma consciência convive, sem grandes perturbações, com o imperativo, quase que irracional, de crescimento económico - i. é, da dinâmica insaciável e irreprimível da oferta e da procura assente na produção e reprodução de bens materiais. Hoje, o conceito de trabalho, não tem uma relação capital com o homem; como o Ângelo diz abaixo: a precariedade banaliza-se, torna-se uma inevitabilidade, faz parte mesma da condição do homem contemporâneo. Hoje, modelos de auto-gestão da colectividade, estimulados, concentrados, ademais das vezes nos centros urbanos, através de projectos locais como o Orçamento Participativo, como o exemplo da cidade de Toronto, desenvolvem-se em paralelo, muitas das vezes em conflito, com os fluxos, aparentemente incontroláveis e consequências da categorizada globalização. Hoje, e como assistimos presentemente na vizinha Espanha, o conceito de Universidade tornou-se, não subitamente, estranho, não se sabe se esta deve ser a auto-estrada para o emprego garantido ou o lugar onde a vocação tem real oportunidade sem estar restringida, condicionada, pelas oportunidades (a oferta) que o mercado de trabalho, hipoteticamente, oferece. Hoje a consciência histórica – particularmente a europeia – torna-nos um pouco mais prudentes, mas, simultaneamente paralisa-nos, como dizia o outro: “nos puxa pelo casaco quando o que queremos é andar para a frente”.
Concluiu afirmando que a solução está na filosofia, não numa filosofia impropriamente institucionalizada, secretariada, mas numa filosofia que procura ir para além destas contradições, não no sentido nietzschiano de as ultrapassar, de se projectar para além delas, mas, mais moderadamente, de as compreender, de saber que as mudanças aqui assinaladas (que embatem frontalmente com velhas estruturas, com velhas mentalidades, com velhas formas de pensar a economia, a política, a sociedade, enfim, a existência colectiva...) são uma oportunidade para integrarmos uma nova ética, para edificarmos a tal nova racionalidade. O retorno ao nacionalismo, que parece querer vingar na grande Rússia (isto consoante nos noticiam), não é uma questão de regressão civilizacional, é uma questão de inadaptação, de incoerência, de ignorância, da falta de uma racionalidade que se consolida a partir das condições materias e pós-materiais vigentes. Precisamos, enfim, de uma filosofia que dê fundamento teórico à nossa acção, que lhe forneça um sentido. A geração à rasca precisa de mais filosofia...
David Santos.
1 comentário:
E aqui se encontra assim um apelo para a aquela que agora pode representar-se como a mais fundamental de todas as necessidades; repensar o pensar.
Ângelo Milhano
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